domingo, 25 de novembro de 2007

LARGO DO CARMO

Lido por Teresa e Maria:

(de 1908 a 1912 mora sozinho num quarto alugado no nº 18, 1º esq

o que diz BERNARDO SOARES:

“Não é nos largos campos ou nos jardins grandes que vejo chegar a primavera. É nas poucas árvores pobres de um largo pequeno da cidade. Ali a verdura destaca como uma dádiva e é alegre como uma boa tristeza.
Amo esses largos solitários, intercalados entre ruas de pouco trânsito, e eles mesmos sem mais trânsito que as ruas. São clareiras inúteis, coisas que esperam, entre tumultos longínquos. São de aldeia na cidade.
Passo por eles, subo qualquer das ruas afluentes, depois desço de novo essa rua, para a ele(s) regressar. Visto do outro lado é diferente, mas a mesma paz deixa dourar de saudade súbita - sol no ocaso - o lado que não vira na ida.
Tudo é inútil, e eu o sinto como tal. Quanto vivi se me esqueceu como se o ouvira distraído. Quanto serei não me lembra como se o tivera vivido e esquecido.
Um ocaso de mágoa leve paira vago em meu torno. Tudo esfria, não porque esfrie, mas porque entrei numa rua estreita e o largo cessou.”
(in "Páginas do livro do Desassossego", 31-05-1932
Brevíssima Portuguesa, Selecção e organização
de Nuno Júdice, Contexto, 1995)

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