quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Diário de Português

Entrei na sala de aula um pouco mal disposto, mas não foi isso que me impediu de estar atento e receptivo a todo o mundo de poesia do grande mestre Fernando Pessoa ou o desprezo incrível de Almada Negreiros pelo Dantas. Como sempre, iniciámos com a leitura de um conto de Italo Calvino. Este foi, sem dúvida, o melhor conto até agora lido, não que os anteriores tenham sido maus, no entanto, identifiquei-me bastante e criou-me uma certa revolta face ao comodismo a que todas as pessoas são habituadas. Na história, o exemplo um pouco tosco do “jogo do mata” era nada mais do que uma metáfora do quotidiano de trabalho e casa a que as pessoas se habituam. Esquecemo-nos por vezes dos verdadeiros valores, aqueles valores que são aprisionados pelos “mandatários” que regem a nossa vida. A frase marcante que escolhi para o trabalho que iremos realizar no final do 2º Período demonstra bem tudo aquilo a que me refiro “como as proibições vinham umas atrás das outras”.

Depois daquela divagação pessoal ao som da voz aguda e num tom calmo da professora, que dava ao texto uma certa delicadeza, passámos em tom grave e despreocupado à leitura do “Ópiário” de Álvaro de Campos, um dos heterónimos de Fernando Pessoa. Esta era a primeira fase, a fase decadentista em que ele se encontrava desinteressado e cansado por tudo aquilo que o rodeava. Era o início de tudo, o início que mais tarde viria dar origem à Ode Marítima e à Ode Triunfal, em que se vai interessar por tudo e fica totalmente fascinado pela máquina e por toda a evolução de uma nova sociedade. Devido à tal má disposição que referi anteriormente, senti o texto ainda mais pesado, senti todo aquele desconforto do autor, naquele momento. Ao longo de frases como “onde o pormenor é uma descida” e “trabalhei só para ter cansaço” demonstra bem tudo aquilo que escrevo neste diário e todo o meu sentimento de revolta face à inércia do quotidiano e de tudo aquilo a que somos habituados. Apesar das diferentes maneiras de escrita, senti uma certa semelhança nos dois textos, pois ambos retratam a revolta do ser.

Deixando o tom pesado e a crítica ao quotidiano, entramos numa crítica bastante mais leve e num certo tom de desprezo em que o autor Almada Negreiros atribuía a tudo a que Dantas representava, o que me fez ainda esboçar alguns sorrisos. Foi numa leitura pausada e muito acentuada que pudemos ouvir o “Manifesto Anti-Dantas” que é muito mais do que apenas um escárnio desmedido a uma pessoa, mas sim a um conjunto de pessoas que mantinham a literatura e toda a evolução agarrada a valores Românticos e Ultra-Românticos. Numa época de contestários e ,eles apenas queriam era chocar Portugal. Como Almada Negreiros, muitos outros o fizeram e um dos grandes exemplos que veio a chocar foi a revista Orpheu que pretendeu, em conjunto com a restante arte, agitar e inovar tudo aquilo a que Portugal se encontrava preso, a tudo aquilo a que Almada se referia como Dantas. É ao longo do Manifesto que eu percebo a atitude radicalista, onde mesmo tendo feito um trabalho sobre tal Geração nunca pude imaginar a dimensão sobre a dureza das críticas. Durante o texto ainda houve espaço para mais do que uma critica ao Dantas, mas também uma critica a uma peça de teatro escrita por tal assassino da literatura portuguesa, onde desde a actriz até a tradução das belas cartas francesas para português tudo era errado. Isto fez-me relembrar um pouco os tempos de hoje em dia em que por mais que queiramos ver algo com qualidade, os portugueses têm uma certa tendência em assassinar o que há de bom.

Por fim, ainda tive a oportunidade de ouvir mais um texto de Fernando Pessoa ortónimo. “O eu fragmentado”; fez-me pensar bastante em cada estrofe, pois em cada estrofe senti a necessidade de desmultiplicar o meu ser e de sentir o mesmo do que ele sentiu. Sinto uma necessidade em comum de nunca parar, de continuar e experimentar, nunca matando a curiosidade e a criança que existe dentro de mim. Não quero a minha alma a aprisionar-me tudo aquilo que de bom há em mim, pois sei que não quero ganhar vícios. Quero ser como ele, viajar e perder países, quero ser antes um mundo do que apenas um ser singular. São todos estes os sentimentos que a poesia de Fernando Pessoa me desperta e me faz reflectir na sua poesia. Não acredito que ele algum dia possa ter sido louco, pois um louco não escreve assim e se o escreve, considerem-me louco pois eu gostaria de escrever assim.

Bernardo, 12º K

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