sábado, 22 de março de 2008

Sobre o acordo ortográfico

Muitas vozes discordantes temos ouvido, mas também há quem esteja de acordo. Ambas as posições apresentam argumentos defensáveis. Aqui vai uma delas, para que possas ir formando a tua própria opinião.

Boas férias!

R



A esta altura do campeonato, creio que já não há muito a ser discutido sobre esta matéria. Quanto mais depressa os portugueses (que são os que mais têm estado a atrasar este processo) se desapegarem de meia dúzia de consoantes que nem sequer são pronunciadas, mais próximos estaremos do início de uma União Lusófona. Eu próprio, que por motivos profissionais estou habituado a fazer um exercício etimológico constante e estou bem consciente dos benefícios da etimologia para um bom domínio da língua, me libertei desse apego afetivo à ortografia: neste comentário experimentei escrever, pela primeira vez, segundo as regras do Acordo Ortográfico, não custa nada... É também verdade que para a grande maioria dos falantes a questão etimológica é absolutamente irrelevante. Note-se que o critério etimológico está repleto de incoerências e arbitrariedades: de acordo com a etimologia, "erva" deveria escrever-se "herva"; "contrato" deveria ser grafado "contracto" e "prático" deveria ser "práctico"; "húmido" com "h" é uma falsa etimologia, deveria ser escrito "úmido"; se escrevemos tranquilamente "pronto" sem "p" em vez do etimológico "prompto", por que motivo nos havemos de arrepiar com um "ótimo batizado"? Para que o critério etimológico fosse realmente coerente, deveríamos respeitar sempre a etimologia e não só de vez em quando, o que nos levaria à ortografia utilizada antes do acordo de 1911 e às "orthographias", "pharmácias", "theorias" e "pyrâmides". A maioria dos sistemas ortográficos são convencionais e arbitrários, julgo que o que nos prende ao "c" de "acção" é sobretudo uma relação afetiva e estética com a grafia da palavra, uma mera questão de hábito. O presente acordo ortográfico prevê grafias duplas para algumas palavras, como "dicção"/"dição", "sector"/"setor", "facto"/"fato"; para estes casos a regra é simples: se se pronucia o "c", escreve-se com "c", se não se pronuncia não se escreve. Nos casos em que a etimologia seja absolutamente relevante e indispensável, como em textos de natureza estética ou filosófica, então que se empregue, excepcionalmente, a ortografia etimológica, ficando tal à responsabilidade do autor. Em todos os restantes domínos do uso da língua, sejamos, de uma vez por todas, práticos!

João Beato, membro do Conselho Editorial da NOVA ÁGUIA

Um comentário:

Anônimo disse...

eu acho um disparate.o português será muito mais rico com as diferentes nuances ortográficas e lexicais dos diferentes países lusófonos.