segunda-feira, 10 de março de 2008

Texto do duche

O Apelo da água

Rodo a torneira.
Rodo a torneira no duche e espero a água.
Antes ainda sinto a rouquidão do manípulo
De ferro que abraço com a minha mão.
Espero então a água.Que me purifique,
Lave de mim o ranger da torneira metalizada
E me transporte para algum outro lugar.
Lá não há ferro, não há engrenagens roucas
ruidosas nem rangentes. Só há paz.
Paz essa não a há aqui, no duche...
Na ausência da água, sou só eu e a torneira.

Range, range...

Vou virando, tornando a virar.
Um segundo parece tardar em "r"s.
Persiste em mim o som, em mim que sou nada.
Torno-me ranger metálico, fusão
Da minha mão com o manípulo da torneira.
Quero a água, sentir o frio, porque a máquina,
A engrenagem, não sente.
Sentir...
Para voltar a ser eu, a ser nada.
Rodo a torneira, rodo...
Não.
Rodo a minha mão e deixo a água cair.
Fuga metalizada.

Álvaro de Campos pela mão de Adriana C 12ºJ

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